Diário da Rússia

Roberto Fendt

Sem surpresas no Copom

A questão não é saber se o BC reduzirá a taxa Selic, mas qual o percentual da redução

O assessor internacional da Presidente Dilma Rousseff foi censurado por declarar em Hannover que o Banco Central reduzirá a Selic esta semana. A censura, contudo, não procede; o assessor revelou um segredo de polichinelo. A questão não é saber se o BC reduzirá a taxa Selic, mas qual o percentual da redução.

O mercado é quase unânime na expectativa da queda da Selic esta semana e no restante do ano. A maioria dos analistas prevê que a taxa básica de juros chegará a 10% na próxima reunião do Copom e a 9,5% no final do ano, com alguns chegando a antecipar que ela baixe até 9%.

É muito ou pouco? Ao contrário do que muitos pensam, gerir a taxa básica de juros não é tarefa trivial. Há restrições a essa gestão, tanto internas quanto externas.

Do ponto de vista interno há pelo menos duas restrições. A primeira delas é dada pela regra de remuneração das cadernetas de poupança. Esse ativo financeiro paga ao aplicador 6% ao ano mais a variação da taxa referencial de juros (TR). A caderneta é o mais difundido instrumento de poupança da população, e mexer em sua remuneração tem consequências políticas sérias. É um vespeiro, e ninguém quer ficar com a pecha de mexer na poupança do povo.

A outra restrição à queda da Selic é a incerteza quanto à taxa de juros “neutra” – a taxa que não afeta o equilíbrio da economia. Quando a taxa de juros de mercado está abaixo da taxa neutra, acentuam-se os riscos de aceleração inflacionária; se ela está acima, o risco é de cercear o crescimento. N

ão há um manual que informe qual o valor dessa taxa. Trata-se simplesmente de uma construção teórica – o pressuposto de bom senso que se a taxa de juros for alta demais ela inibe a economia e que, quando baixa demais, incentiva exageradamente a demanda. Portanto, deve haver uma taxa entre essas duas que não tenha efeitos positivos ou negativos sobre o PIB e a inflação.

O governo trabalha com a hipótese de que a taxa de juros “neutra” vem se reduzindo em razão da melhoria dos fundamentos econômicos. Ela até pode estar se reduzindo, situando-se hoje entre 4% e 5%. Aliás, é esse tipo de cálculo que está por trás da expectativa de que a Selic pode chegar a 9% ou 9,5% em dezembro deste ano.

É uma história estimar que a taxa de juros “neutra” e a expectativa de inflação para o final do ano autorizem a projeção da Selic de um dígito ainda este ano. Imaginar que a taxa “neutra” tenha se reduzido pela melhoria dos fundamentos econômicos é outra.

Não há qualquer indício de que os fundamentos estejam melhores hoje que há um ano. A economia deve ter crescido menos de 3% em 2011; a inflação continua elevada e há suspeitas de que o BC mudou de fato sua meta de 4,5% para 6,5%; os riscos de um período prolongado de baixo crescimento da economia mundial se acentuaram. Portanto, temos apenas um sentimento de que a taxa de juros neutra se reduziu, sem sabermos bem exatamente o por quê.

É o lado externo, aliás, que explica a necessidade de redução mais acentuada da taxa básica de juros – ou o uso de outros instrumentos com efeito similar. Tanto o Fed (banco central dos EUA) como o Banco Central Europeu promoveram recentemente uma nova rodada de aumento significativo na liquidez do mercado. O prazo dos empréstimos dessas instituições garante que iremos conviver com essa nova inundação de liquidez por pelo menos três anos.

As taxas de juros nos países desenvolvidos estão em seus níveis históricos mais baixos, situando-se na maioria dos países industrializados abaixo da taxa de inflação esperada. Nessa circunstância, parte dos recursos injetados pelos bancos centrais está desembarcando nos países onde as taxas de juros reais são positivas. No Brasil está a melhor dessas praias, já que as taxas aqui são as mais elevadas e os riscos menores.

Com os limites internos impostos à redução da Selic e a necessidade de evitar que a entrada de recursos externos persista no atual ritmo, fica clara a necessidade de intensificar as medidas macroprudenciais já impostas. A imposição dessas medidas está respaldada pelo acordo de Basileia 3.

A intensificação do uso dessas medidas se torna ainda mais necessária caso persistam as expectativas de alta da Selic em 2013 por um grande grupo de analistas. Em razão disso, eles apontam para um aperto das condições monetárias na virada do ano de 2012 para 2013. Esse aperto poderia vir tanto pela elevação da Selic, o que parece menos provável, como por novas medidas macroprudenciais. A questão é saber se o BC vai esperar a virada do ano ou não, caso entenda que não deva alterar o ritmo de redução da Selic.

[Este artigo foi originalmente publicado no "Diário do Comércio", de São Paulo.]

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